terça-feira, 18 de maio de 2010

LEWIS CARROLL E SUA MUSA INSPIRADORA "ALICE": ALICE NO PAÍS DAS MARAVILHAS

É praticamente impossível imaginar, como insistem alguns biógrafos, que ao se aproximar de suas amiguinhas - das quais se despedia nas cartas com ''10 milhões de beijos'' e costumava pedir cachos de cabelos de presente para beijar - Carroll estivesse apenas movido por um amor puramente espiritual. As explicações são inúmeras, como se pode ver nas anotações de Gardner, que cita várias fontes de interpretação, como a da psicanalista Phyllis Greenacre, para quem talvez Carroll tivesse um Édipo não-resolvido, sendo possível que identificasse as menininhas com a mãe. Assim, Alice seria o símbolo materno de Carroll. Afinal, a diferença de idade entre o autor e sua musa era quase a mesma que o separava de sua mãe, diz a psicanalista, assegurando que essa ''inversão da fixação edipiana é bastante comum''.


Pode ser, tudo pode ser. Na verdade, as excentricidades de Lewis Carroll, solteirão convicto, reverendo que jamais conseguiu chegar a ser pastor devido à gagueira e a uma timidez incurável, são tantas que, assim como o nonsense de sua ficção, dificultam uma conclusão definitiva. Como explica Gardner na introdução da edição comentada, a dificuldade de analisar qualquer obra cheia de fantasia é a profusão dos símbolos convidativos a inúmeras interpretações. ''Como Homero, a Bíblia e todas as outras grandes obras de fantasias, os livros de Alice prestam-se facilmente a qualquer tipo de interpretação simbólica - política, metafísica ou freudiana'', declara. Shane Leslie, por exemplo, em Lewis Carroll and the Oxford movement, encontra em Alice uma história secreta das controvérsias religiosas da Inglaterra vitoriana. O pote de geléia, diz o comentador de Alice, seria o símbolo do protestantismo. Uma referência a Guilherme de Orange - captou? E por aí seguem-se dezenas de outras interpretações tão bizarras quanto a própria obra.

Nenhuma especulação, no entanto, desperta tanta curiosidade quanto as que se referem à vida do autor e à sua relação com a ninfeta Alice. Na leitura que faz da questão, Gardner esquiva-se de apostar na tese de pedofilia, deixando a questão em aberto. ''Estava Carroll apaixonado pela Alice real? Sabemos que a sra. Liddell percebeu algo de insólito nas atitudes dele em relação à filha, tomou medidas para desencorajar-lhe as atenções e finalmente queimou todas as primeiras cartas para Alice''. Mais à frente, ele completa: ''As menininhas de Lewis Carroll talvez o atraíssem precisamente porque com elas se sentia sexualmente seguro. Havia na Inglaterra vitoriana uma tendência, que se reflete em grande parte na literatura e na arte, a idealizar a beleza e a pureza virginal das meninas. Isso sem dúvida tornou mais fácil para Carroll dar por certo que seu gosto por elas se situava num elevado plano espiritual.''

Uma das melhores páginas sobre esse conflito não está, no entanto, nesta edição comentada, mas sim na interpretação de Katie Roiphe, autora de Still she haunts me (Ela ainda me assombra), livro que romaceia a relação entre Carroll e Alice. Para Roiphe, ensaísta renomada que deu com essa história seu primeiro passo na ficção, há uma certa nobreza no autocontrole de um homem que lutou a mais árdua de todas as batalhas do mundo: seu próprio desejo. Ela diz: ''É impossível para nós contemplar um homem que se apaixonado por garotinhas sem querer colocá-lo na prisão. As sutilezas, para quem vive as paranóias do século 20, são difíceis de serem compreendidas. O amor de Carroll não era nabokoviano; era delicado, torturado e esquivo. Era uma paixão muito estranha e complicada para ser definida em uma única palavra'', escreve. Ao fim de um artigo escrito recentemente para o jornal The Guardian a respeito de Carroll, ela conclui: ''Ele tinha pensamentos, impuros, sim. O que importa, no fim, é o que ele fez deles.''

Apesar das fotografias com forte apelo erótico e das cartas melosas que escreveu para meninas como Alice (publicadas no Brasil com o título Cartas às suas amiguinhas), a veredicto final sobre o que Carroll teria feito de seu desejo ainda é um mistério. Uma coisa é certa: em meio a toda essa paranóia sobre a pedofilia, especialmente na internet, se toda essa história acontecesse hoje, é provável que um dos autores mais célebres da literatura infantil estivesse em desgraça ou mesmo preso. A malícia dos olhos do século 21 talvez não apenas tenha desfeito o fascínio pelas aventuras de uma menina perdida no país do absurdo como também tenha rompido definitivamente o véu que separa a fantasia da perversidade. Um caminho sem volta. (C.N.)

Um comentário:

  1. Ah, eu acho que era um coisa meio espiritual...
    Ele amava tanto as suas menininhas, e sendo um "pastor fracassado", duvido que ele fosse sujar a "pureza" que elas tinham...
    É como Charlie Chaplin, que dizem que tinha tara por virgens, por apenas casar com garotas entre os dezesseis e dezoito.. Acho que não. Acho que ele pura e simplesmente acha o comportamento tido como "virginal" fascinante. Inclusive acho que todas as mocinhas dos filmes dele tinham todas aquela coisa de timidez virginal que ATÉ ELE MESMO imita em muitas cenas. Sei lá. Acredito na inocência deles, talvez até porque eu ame tanto os dois...

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